terça-feira, 20 de março de 2012

ELA É A "DONA" DO PETRÓLEO

Graça Foster , desde o dia 13 de fevereiro do corrente ano,  tem nas mãos o comando da Petrobrás, a quinta maior petrolífera do mundo (dois milhões e meio de barris por dia, 132 plataformas em ação, 291 navios em alto mar), uma gigante que vale 186,6 bilhões de dólares.É uma mulher forte,determinada,cônscia da importância do trabalho que faz, mas que sente o peso e a solidão que o poder e o excesso de trabalho trazem.
               
    Funcionária de carreira, ela não esconde que vive para o trabalho: a primeira reunião do dia é às 7h30min e raramente volta  para casa antes das 22h. Guarda duas malas prontas na sua sala, no Rio de Janeiro, para viagens emergenciais e sempre leva tarefas para os fins de semana."Abri mão de muitas coisas pessoais pela empresa e não me arrependo de nada. Amo o que faço. Adoro adrenalina e frio na barriga. É por ser um trabalho tão difícil que estou completamente envolvida", diz. "Sinto um prazer enorme quando consigo converter algo potencialmente difícil em grande resultado econômico."
   Mas Graça não recebeu nada de mão beijada. Nasceu em Caratinga, interior de Minas Gerais, e tinha 2 anos quando o pai, um vendedor, e a mãe, bordadeira,  mudaram para o Rio de Janeiro. A família, de poucos recursos financeiros, foi viver no Mono do Adeus, atualmente parte do Complexo do Alemão.Com 8 anos, Graça escrevia cartas para os vizinhos, amassava latinhas de cerveja e juntava jornais para ganhar seus trocados. Um pouco mais tarde, passou a dar aulas de matemática para financiar os estudos.
   No segundo ano de Engenharia Química na Universidade Federal Fluminense, engravidou. A jovem mãe balançava o carrinho com os pés para o bebê dormir enquanto se debruçava sobre os livros. Em 1978, no último ano da faculdade, entrou como estagiária na Petrobras. Foi engenheira de campo, coordenadora de projeto, supervisora, chefe de setor, gerente geral e executiva, presidente da Petrobras Distribuidora S.A. e da Petroquisa. Com mestrado em Engenharia Nuclear pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e MBA em Economia pela Fundação Getulio Vargas, só se afastou da empresa entre 2003 e 2006 para assumir a Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, quando implantou o Programa de Produção e Uso de Biodiesel. Em 2007, tornou-se a primeira mulher a assumir uma diretoria na Petrobras na área de Gás e Energia, que na época dava prejuízo de 1,3 milhão de reais e, sob seu comando, acumulou lucro de 2,6 milhões até setembro de 2011.
   Graça usa pouca maquiagem, brincos, anéis, colar e pulseiras sempre. Casada pela segunda vez, tem dois filhos, Flávia, 36 anos, pediatra e capitã do Corpo de Bombeiros, e Colin, 23 anos, estudante de jornalismo, e uma neta, Priscilla, 16 anos.
     Ela concedeu esta entrevista dois dias após tomar posse. Foram 50 minutos de conversa, rigorosamente cronometrados por seus assessores.

Você declarou que "tinha de matar 500 leões por dia" quando era diretora de Gás e Energia. Agora, na presidência, qual o tamanho do desafio?
 São os 500 leões que estão lá, vivos, somados a mais uns 3 mil leões que fazem o conjunto da obra (risos).Prefiro as atividades técnicas, mas agora vou ter mais compromissos diplomáticos e políticos, porque nem tudo se resolve com caneta.Precisamos do apoio dos parlamentares, dos ministros e de um bom relacionamento nos estados, com o Exército, com a Marinha.

As ações da Petrobras subiram no dia em que seu nome foi anunciado para a presidência. Como fica seu coração quando pensa na menina que vivia no Complexo do Alemão e lutava para vencer na vida?
Se aquela menininha não fosse tão valente, eu não estaria aqui hoje. A diferença é que havia muito carinho na minha casa. Já no ambiente de trabalho, nesse processo de ascensão na carreira, não existe amor, mas competição e um jogando contra o outro.

Sua fama é de ser firme, exigente, centralizadora e brava.
Existem muitas lendas a meu respeito. Sou muito objetiva, procuro transformar as dificuldades em oportunidades e tenho minhas metas sempre muito bem colocadas. Mas, se estou comandando uma reunião e percebo que existe discórdia e desrespeito, não aceito agressão; procuro moderar, suavizar o tom e reduzir a pressão a favor do grupo. Minha vida me fez ser forte, mas também choro e me sinto solitária. O poder tem como consequência a solidão.

Você se sente solitária?
 O assédio cresce à medida que se sobe na carreira. Então, abrir o coração fica cada vez mais difícil. O comum é me fechar e tratar tudo de forma profissional. As pessoas que são sinceras e amigas acabam ficando para trás, não consigo mais chegar até elas. Esses dias, recebi um email muito carinhoso da minha primeira secretária, que conheço há mais de 30 anos. Só respondi: "Um beijo no seu coração". Eu queria marcar um almoço, mas não tenho tempo nem para escrever mais; logo estão me chamando para duas, três reuniões. Quando fiz minha pequena lista de convidados para a posse, me lembrei da Conceição, que serviu café para mim quando entrei na Petrobras. Foi uma alegria imensa vê-Ia na fila dos cumprimentos. Me distanciei de pessoas queridas, mas elas continuam no coração. Meu motorista está comigo há oito anos. Falei que ele ia ficar com o outro diretor, mas ele teve uma crise e permaneceu comigo. É alguém que me escuta. Sinto falta de bater papo com uma amiga; de, no lugar de escrever uma linha, escrever  três frases.Sinto muita saudade das pessoas.

Quais atitudes mais admira e exige de suas funcionárias e o que não suporta em uma subordinada? 
Mulheres e homens são diferentes. Eu não tenho força para levantar essa mesa.Um homem talvez levante. Mulheres ficam grávidas, são mais sensíveis por causa dos hormônios. Elas, em geral, são mais perspicazes. Numa negociação, sabem a hora de diminuir a pressão para não perder o controle e voltam depois buscando harmonia. Agora, do ponto de vista do intelecto, são exatamente iguais e ambos devem estar igualmente preparados.

Sente culpa quando exagera nas broncas? 
Sim, e peço desculpas, tento me retratar, compensar de alguma maneira. Preciso pedir desculpas; caso contrário, não durmo à noite.Me arrependo apenas quando sei que poderia ter agido de outra forma. Só não posso ser conivente com a falta de dedicação e a irresponsabilidade diante de um fato grave.

Quais os principais objetivos que deseja alcançar na presidência? 
Quero deixar como colaboração a valorização das ações da Petrobras. Isso só vai ocorrer com o aumento da produção do petróleo. Outra prioridade é o etanol, que nos próximos quatro anos será fundamental para a Petrobras, pois trará equilíbrio à nossa produção de gasolina comum.

Quanto ao meio ambiente, tem planos para evitar vazamentos como o ocorrido recentemente na Bacia de Santos?
O meio ambiente é minha prioridade absoluta. A prevenção tem sido um investimento pesado da Petrobras nos últimos dois anos e garanto que nesse setor não haverá redução de custos. A política hoje é: na dúvida, pare. Um gerente de plataforma tem não só o poder mas o dever de parar a operação se ficar em dúvida quanto a qualquer um dos milhares de processos ali.

Graça Foster tornou-se um exemplo para brasileiras de todas as idades. O que tem a dizer para meninas de baixa renda que almejam uma carreira de sucesso?
Não aceite os limites que os outros lhe impõem e, principalmente, não crie limites para você mesma. Proteja sua autoestima. Há muitas coisas na minha vida que me deixam tristes, que eu gostaria de ter feito diferente, mas eu não valorizo isso. Valorizo o que deu certo, o que eu sou.
           (Patrícia  Negrão, revista CLAUDIA, março de 2012.)

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