sexta-feira, 22 de julho de 2016

DETALHES TÃO PEQUENOS

      O egoísmo e o orgulho são duas chagas do ser humano que facilitam não sermos felizes. Para vencermos o egoísmo, é preciso desenvolver a benevolência. Para acabarmos com o orgulho será necessário cultivarmos a humildade. Vivemos dias difíceis em nosso país e, com isso, passamos de indignados a desanima- dos. Corrupção, violência, desamor, onde o cada um por si é a regra, nos causam muitas vezes uma paralisia patológica em nossas emões positivas.
     Só reclamamos! Nosso relacionamento conosco e com os outros, torna-se negativo, vin-gativo. Nos enfurnamos em nós mesmos. Desistimos de ser felizes. De olhar a vida como uma possibilidade positiva a partir de uma decisão pessoal de pensar, sentir e agir diferente.
     Façamos, neste fim de semana, uma varredura em nossas emoções negativas e destru-tivas. Adianta você ficar assim? Vai mudar alguma coisa para melhor? Claro que não! Então porque persistimos, aceitando só o mundo cruel que nos impõem a mídia e os outros?
     Roberto Carlos já cantava "detalhes tão pequenos de nós dois" nos remetendo a uma paixão por alguém. Aqui gostaria de ampliar esta paixão: um amor muito grande pela vida. pelo outro que está em minha vida. Um familiar, um amigo, alguém necessitado de reconhecimento, um vizinho que nדo visito mais. Enfim, um outro que, na verdade, está dentro de mim  espera da minha decisão de nos fazermos felizes. Quem sabe um pequeno gesto de carinho, um alô pelo celular, um e-mail, um toque com ternura? Uma ponte sobre o rio gelado para que o outro sinta o calor humano que queima em você.
    Que nesse fim de semana possam teus gestos, o teu agir, servir de pontes entre teus sentimentos de amor e o que está aí ao teu lado. Lembra da história daquele homem que de manhã chegando a uma praia se depara com centenas de estrelas do mar deixadas na areia pela maré. Muitas já morrendo, pelo calor do sol! Nisso, ele vê um menino que, rápido, atirava uma estrela do mar para dentro d’água. Impressionado com a cena, perguntou ao jovem:
     - O que estás fazendo? São centenas delas! Não vais conseguir salvá-las!
      E o menino respondeu;
    - Mas para esta eu faço a diferença - e atirou a estrela no mar.
 (José  Otávio  Binato  -  Diário de Santa Maria, 19/06/2016)

quarta-feira, 6 de julho de 2016

DISTÂNCIAS

 

   Ouvi um cara dizer, num programa de TV sobre tecnologia, que o conceito de distância, tal como eu e os de minha geração o aprendemos, está extinto. Hoje você checa no Facetime do celular e, numa fração de segundos, fica cara a cara com alguém que pode estar do outro lado do mundo. Havia, no tal programa, uma penca de garotos explicando o uso de muitos outros aplicativos de que nunca ouvi falar. Não é Skype não, que isso já está velho e batido - embora sejam variações do mesmo milagre de pôr as pessoas em contato visual imediato, como nos desenhos animados e nos filmes de ficção científica que assisti na infância, quando aquela cruza de televisão com telefone era uma proeza futurista.
   Pois não é que o futuro veio num zás? E já chegou radicalizando a predição que Marshall McLuban fez, em meados do século passado, segundo a qual os meios de comunicação de massa redefiniriam os conceitos de tempo e distância, e nos levariam a um processo de retribalização, pois estaríamos todos, independentemente das barreiras geográficas que nos separam, vivendo na mesmíssima aldeia global. E olha que ele estava falando de rádio e televisão, sem ter a menor ideia de que um dia poderia existir algo parecido com a internet.
   Dias atrás, no saguão de embarque do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, eu vi uma senhora italiana de uns 60 anos falando, via Facetime, com o pai dela, um velhinho que deve ter quase 90. A mulher comia um sanduíche e punha o celular em pé, no colo, para que o pai lhe fizesse companhia durante o lanche., e a visse abocanhar nacos de pão. Pelo que entendi, ele estava em Roma, e a filha lhe dizia que estava a caminho do Rio de Janeiro. Ambos se divertiam com o brinquedo tecnológico e faziam troça da distância, ou da falta dela, tendo o pai pedido à filha um pedaço do sanduba, abrindo a bocarra para dar mordidas virtuais e, em seguida, gargalhar a valer.
    Na fileira de cadeiras bem defronte, uma moça triste e um homem sério, sentados lado a
lado, estavam, cada um em seu celular, mergulhados em suas contas do Instagram, passando fotos em sequência com os dedos, no mesmo movimento ritmado. Só me dei conta de que eram um casal quando a mulher cutucou o homem para saber se ele estava com as passagens, no que recebeu uma resposta atravessada. Acho que são cariocas. Acho que são casados. Acho que vivem juntos. Apesar da fenda abissal que abriram entre uma cadeira e outra.
   McLuhan não sabe de nada. A Roma do velhinho está ao alcance dos olhos da filha. Mas o Rio da moça triste e o Rio do homem sério ficam em planetas diferentes.

 (Marcelo  Canellas – Diário de Santa Maria, 12/06/2016)