quinta-feira, 29 de novembro de 2012

CABEÇA DE OTIMISTA


    Por que a gente acredita que tudo vai dar certo - mesmo com tanta desgraceira aparecendo no noticiário? Porque nossos neurônios armazenam mais as expectativas positivas, explica a pesquisadora Tali Sharot, que aliou psicologia e neurociência para mostrar que o cérebro produz otimismo como estratégia de sobrevivência.  POR_ISABELA NORONHA  

    Você se casou achando que é para sempre? Sai de casa todo dia com a certeza de que chegará bem? Bebe umas e fuma um cigarrinho sem ter pensamentos alarmistas demais com a saúde? É seu cérebro otimista trabalhando. "Tendemos a superestimar a probabilidade de coisas boas acontecerem com a gente e subestimar as ruins", explica a neurocientista israelense Tali Sharot. Não é que não acreditemos nas tragédias que pululam nos noticiários. A gente se sensibiliza, perde a fé na humanidade, acha que a economia não segura, que o mundo está perdido...Mas nosso próprio futuro tende a permanecer imaculado, cor-de-rosa. É que, se não acreditássemos que tudo vai dar certo, nem sairíamos de casa. E, possivelmente, ficaríamos loucos com a única certeza que realmente podemos ter sobre o que virá: mais dia, menos dia, partiremos desta para melhor - olha aí outra previsão otimista. Por cinco anos, Tali estudou o cérebro para descobrir como é possível que sempre esperemos coisas boas, mesmo tendo informações suficientes para ter expectativas mais realistas. O estudo foi publicado no livro The Optimism Bias (O Viés Otimista, em tradução livre). Em entrevista a LOLA em seu escritório, no quinto andar do Centro de Neuroimagem da University College of London, no centro da capital inglesa, Tali explica por que o otimismo é uma estratégia do cérebro - para o nosso bem. 

LOLA: O que faz uma pessoa ser otimista? 
TAL! SHAROT: Isso é determinado por uma combinação genética. Alguns genes estão ligados ao otimismo, geralmente os mesmos que são relacionados à depressão. Cerca de 80% das pessoas tem o viés otimista. Claro: você pode ter mais ou menos viés. Há pessoas extremamente otimistas, outras moderadamente, e por aí vai. Estima-se que 30% ou 40% do quão otimista você é baseia-se na genética. O restante são experiências e a influência da família e do ambiente. 

Então, há relação entre depressão e otimismo? 
A depressão é como se fosse uma imagem espelhada do otimismo, está ligada ao pessimismo. A depressão tem relação com a ausência do viés otimista. Uma depressão moderada não está relacionada a nenhum viés, quando o cérebro responde igualmente às informações positivas e negativas. E a depressão severa está relacionada ao viés pessimista, quando as pessoas esperam que as coisas sejam piores do que acabam sendo. 

Você diz que a maioria das pessoas tem o viés otimista. Mas há muita gente que não se vê assim. Por que isso acontece? 
O viés é justamente isso: acreditar em determinadas coisas mesmo que sejam pouco realistas. Mas, para nós, nossa previsão é realista. Se nos considerássemos otimistas, estaríamos admitindo que o que pensamos que vai acontecer é, na verdade, pouco provável. 

É por isso que em seu livro você chama o otimismo de ilusão? 
Sim, o otimismo é algo que criamos, mas não de forma consciente. Ele é produto de processos básicos do cérebro. 

Que processos são esses? 
Algumas partes dos lobos frontais, a parte da frente do cérebro, respondem mais a informações positivas sobre o futuro do que a negativas. Responder significa processar, levar uma informação em conta e incorporá-Ia às suas convicções. Também descobrimos que, quando imaginamos o futuro de forma positiva, partes dos lobos frontais e a amígdala, uma pequena estrutura cerebral importante para processar emoções, ficam mais ativas. Assim, imaginamos eventos bons de maneira mais vivida e construímos uma imagem melhor. Possivelmente porque os lobos frontais estão modulando as atividades da amígdala, direcionando-a a associações positivas. 

E por que o cérebro age dessa maneira? 
O otimismo oferece vantagens para a sobrevivência. Pessoas otimistas tendem a viver mais. Elas são mais saudáveis, porque ficam menos estressadas. E geralmente são mais propensas a tomar atitudes que as ajudem a se desenvolver e a seguir em frente. 

Mas os pessimistas não são menos vulneráveis a frustrações? 
Não. Primeiro porque é menos provável que um pessimista seja bem-sucedido. Se ele pensa que nada vai dar certo, nem se esforça. Além disso, expectativas positivas nos deixam felizes por si só. Um pessimista passará as semanas antes de um exame importante sofrendo, o otimista ficará bem. E não é que ele não vá estudar - ele acha que tudo dará certo justamente porque vai trabalhar para isso. Economistas da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, mostraram que otimistas normalmente se esforçam mais. Por fim, se eles não alcançam o resultado desejado, não se sentem piores. O que o otimista tende a fazer é interpretar a realidade ruim como algo passageiro. 

Você diz que normalmente achamos que vai dar certo para a gente, mas não somos tão otimistas com relação ao vizinho ... 
O viés otimista está relacionado a outros vieses comuns: a "ilusão de superioridade" e o "efeito melhor que a média", em que acreditamos ser melhores do que realmente somos e melhores do que as outras pessoas. Se você se acha especial, o próximo passo lógico é acreditar que tudo vai dar certo, que seu futuro será melhor que o dos outros. 

No livro, você cita uma experiência em que estudantes recebem, aleatoriamente, palavras como "esperto" e "estúpido" e acabam agindo de acordo com elas. Isso poderia ser aplicado, por exemplo, na educação de nossos filhos? 
Suponho que sim. Quando as pessoas têm expectativas positivas, tendem a se esforçar mais. Mas não é só isso. Nessa experiência, o que se percebeu é que, quando você espera o melhor de si mesmo, também aprende mais com os erros, porque eles são interpretados como surpresa pelo cérebro. Se você diz a seu filho que ele é bom em futebol e ele joga mal, depois ele tenta entender. "Era para eu ter ido bem, o que eu fiz de errado?" Mas, se não há a expectativa de que jogará bem, ele não refletirá sobre isso. E também não aprenderá. 

Não há riscos em ser otimista? 
Há riscos no excesso, porque você tende a não tomar as atitudes necessárias para se preservar. Já foi demonstrado que o otimismo extremo está ligado a fumar mais, por exemplo. Um otimista extremo pensa: "Vou fumar porque nunca ficarei doente". Um otimista moderado leva em conta mais informações para tomar essa decisão. Os otimistas extremos são cerca de 20% das pessoas. Então, a maioria de nós é moderadamente otimista. Você pode continuar esperando o melhor, mas tem que se cuidar. 

Não é uma contradição? 
Não. É possível ter o melhor dos dois mundos. Não estou sugerindo que você seja menos otimista. Mas saiba como seu cérebro funciona e previna-se contra consequências do excesso de otimismo: tome atitudes para se proteger se nada sair como o esperado. 

Dá para aprender a ser mais otimista? 
Alguns estudos indicam que sim. O psicólogo americano Martin Seligman tem pesquisas mostrando que métodos semelhantes à terapia cognitivo-comportamental, em que há uma mudança na forma de interpretar a realidade, conseguem tornar as expectativas otimistas. Quando um pessimista recebe uma promoção, por exemplo, tende a pensar: "Isso só aconteceu porque fulano saiu da empresa, não tem nada a ver com minhas qualidades ou com o futuro e com outras áreas da minha vida". Um otimista promovido pensa: "Isso é porque eu sou talentoso e, portanto, me sairei bem não só no meu trabalho, mas em tudo o que fizer". No método que Seligman usa, ele ensina as pessoas a interpretar acontecimentos positivos como os otimistas, ou seja, como duradouros. estáveis e aplicáveis a outras áreas. E os negativos, da forma inversa. 

Mas isso altera os processos no cérebro?
 Toda conversa, tudo o que acontece com você, muda a forma como os neurônios conversam entre si. Claro: é uma questão de grau, de fazer as coisas com frequência. Por exemplo, na primeira vez em que joga tênis, as mudanças que ocorrem são poucas. Mas, se você joga várias vezes, modifica as conexões entre os neurônios. Por isso, após dois anos jogando, é automático: seu cérebro se acostumou a determinados movimentos. 

Qual a relação entre memória e otimismo? 
O cérebro usa o mesmo sistema para lembrar e para imaginar o que virá. A imaginação baseia-se em fragmentos de memória. Para prever algo, sua próxima festa de aniversário, por exemplo - você usa sua memória. É dela que você tira informação. Você se lembra do restaurante em que fará festa, dos convidados - talvez nem de festas suas, mas de seus amigos. É tudo uma questão de como você combina esses fragmentos para produzir algo novo. 

Então, os otimistas são aqueles que veem o lado bom do passado? 
De forma alguma. A gente não analisa o passado com um viés. Não é preciso ser positivo em relação ao que passou para ser positivo em relação ao futuro. Um otimista olha para trás e pensa: "Errei nos meus cinco últimos relacionamentos, mas aprendi e, por isso, meu próximo namoro vai dar certo". Ele avalia o passado para descobrir como fazer o futuro ser melhor, independentemente de esse passado ter sido bom ou mim. 

Às vezes, conseguimos o que havíamos imaginado, mas não parece tão bom ... 
É difícil saber o que nos fará feliz. Quando imaginamos o futuro, pensamos em apenas parte dele. É como ver o trailer de um filme só com cenas emocionantes. E a gente prevê como vai se sentir baseando-se nisso. Quando o futuro chega, os momentos empolgantes até estão lá, mas a maior parte dele é a vida comum. Quando fazemos escolhas - em que cidade viver, onde passar as férias, tendemos a nos basear apenas na parte boa, não em nosso dia a dia. E aí a gente erra. 

Agora que sabemos disso, ficaremos menos otimistas? 
Não. A ilusão do otimismo é como qualquer outra. Mesmo que saibamos que ela existe, não deixamos de tê-Ia. Não é algo que possa ser modificado pelo conhecimento. 

Então não é verdade que, quanto mais velhos, mais sábios somos? 
Depende da definição de "sábio". Não acho que ter expectativas realistas seja sábio. Ser otimista torna sua vida melhor.  

       (Revista LOLA, outubro de 2012.)

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

SEIS PRESENTES PARA SEMPRE

   Seu filho pode não gostar a princípio, mas as ideias desta reportagem são valiosas para fazer dele uma pessoa melhor para o resto da vida.  
DÉBORAH DE PAULA SOUZA 

   Civilização começa em casa. Da arrumação da cama a valores básicos, como verdade e responsabilidade, o núcleo duro da educação segue estável, mas o século 21 trouxe novos códigos e desafios para pais empenhados em criar filhos equilibrados. Há verdadeiros presentes que você pode entregar (mesmo que as crianças não enxerguem dessa forma no primeiro momento e se sintam frustradas) com a certeza de estar cumprindo seu papel de educar. Para criar esse "pacote" pedagógico funcional, CLAUDIA ouviu pais e três feras: Ceres Araújo, psicóloga especializada em crianças e adolescentes, professora de pós-graduação em psicologia na PUC-SP; Silvia Viegas, educadora, coordenadora do ensino fundamental na Escola Viva, em São Paulo; e a consultora financeira Elaine Toledo, de São Paulo. 

1- FACEBOOK SÓ DEPOIS DOS 13 
O que dizem a rede e os especialistas: A idade mínima exigida pelo regulamento do Facebook é 13 anos, e a empresa recomenda que até os 18 anos o perfil seja fechado ao público. Para a psicóloga Ceres Araújo, é importante tentar cumprir a regra. Hoje, as crianças em geral mentem a idade para registrar o perfil- mas Ceres diz que os pais não devem compactuar com a mentira. Aliás, o impasse que as redes colocam para todos nós é exatamente este: a mentira e a criação de falsas identidades. "Criança não deve entrar. Se ela quiser estrear aos 13, sua atividade na rede precisará ser monitorada até a maioridade", opina. "E os pais têm direito de conhecer a senha dos filhos enquanto eles forem menores de 18 anos." O conselho da psicóloga: desde o início: combine com o adolescente que de vez em quando o pai ou a mãe entrarão no mural dele. Faça isso com ele por perto, pois monitorar não é invadir. Explique os motivos da atitude alertando sobre questões de segurança e privacidade na rede e o risco da aproximação de pessoas com identidades falsas. Peça que conte quando surgir qualquer contato que cause estranheza. 
O que dizem os pais: Qualquer criança de 8 anos já sabe como driblar a regra oficial do Facebook. A garotada tem acesso a computadores em casa, nos clubes e nas escolas e falseia a idade para entrar na rede. É o caso de Gabriel, 10 anos, filho da dentista Márcia Freitas, de São Paulo. "Um dia cheguei do trabalho e o Gabriel veio me mostrar o perfil dele. Minha filha mais velha, que já faz faculdade em outra cidade, reclamou comigo, disse que era cedo, mas ele alegou que a maioria dos colegas da escola já está no Face." Márcia ficou amiga dele e da turma toda para monitorar. "Para mim, o pior não é ele ter mentido a idade no formulário eletrônico - no mural, está com foto e nome verdadeiros -, e sim o fato de ficar exposto a conteúdos que nem sempre podemos controlar. Fico de olho." Nicolau, 11 anos, filho do empresário Marcos Labriola, de São Paulo, também é ativo no FB. "Ele registrou que tinha 19 anos, mas colocou sua foto de criança e conversa com os colegas da escola. Além deles, eu, a mãe e alguns adultos do nosso convívio nos tornamos amigos de Face. Isso salvou o garoto num grande apuro. Na lan house do clube, Nicolau esqueceu de fechar a página dele na hora de ir embora. Resultado: outro garoto a invadiu e xingou todo mundo. "Um amigo nosso estranhou e nos comunicou imediatamente", conta o pai. "Eu e a mãe comandamos uma verdadeira força-tarefa: bloqueamos o acesso, avisamos o funcionário do clube e aí minha ex-mulher entrou no mural dele, apresentou-se, pediu desculpas e explicou o que tinha acontecido. Tem que monitorar. Digo ao meu filho que a rede é como a rua: não dá para ficar amigo de todos. Pode existir violência, boato, bullying. A maior segurança é estar presente no cotidiano deles." 

2-REGULE O USO DE CELULAR 
O que dizem os especialistas: Mais importante do que fixar regras é mostrar o sentido de liberar ou proibir em certos momentos, acredita a educadora Silvia Viegas. Na escola onde ela trabalha, funciona assim: os adolescentes do ensino médio podem portar celular, mas devem desligá-Io em sala de aula. Já no ensino fundamental, é simplesmente proibido. Se o aluno insistir, o aparelho será recolhido e devolvido ao responsável. "No horário escolar, os pais sabem que a criança está lá. Proibimos quando percebemos que muitas crianças não interagiam mais, ficavam no seu canto, entretidas com fotos e joguinhos. A escola deve estimular o convívio e as trocas pessoais", afirma Silvia. Na opinião dela, o papel dos adultos é mostrar que as escolhas dependem de reflexão e acordos. "Nossa orientação aos pais é que expliquem às crianças os motivos da compra e as condições de uso - seja de celular, de computador, seja de tablet, etc. Isso os ajudará a perceber qual é a melhor hora para oferecer um aparelho ao filho." 
O   que dizem os pais: O empresário Marcos Labriola liberou o celular para o filho mais velho, Diego, 13 anos. "Facilitava, por exemplo, localizá-Io na hora de buscar no clube." Mais tarde, o caçula, Nicolau, 11, ganhou um aparelho de uma tia. "Mas prefiro que brinquem, joguem bola, leiam mais." 

3-DELEGUE TAREFAS EM CASA 
O que dizem os especialistas: Guardar os brinquedos, fazer a própria cama, ajudar a pôr e tirar a mesa das refeições, enrolar os brigadeiros da festa ... São muitas as possibilidades de uma criança pequena participar das atividades da casa. Com a idade, as tarefas podem ficar mais complexas. "É possível ensinar tudo de um jeito lúdico e criativo", sugere Ceres Araújo, para quem a prática desenvolve a autonomia e combate o egoísmo. A criança percebe que ela tem um papel, que aquilo que faz pode beneficiar a todos. Isso é valioso para o presente e o futuro, mas geralmente as mães brasileiras poupam os filhos." Aqui, o hábito de contratar empregadas domésticas dificultou ou adiou a colaboração dos pequenos em casa. Mas essa é uma tendência em declínio, e o estímulo das competências tende a crescer. Cabe aos pais educar os pequenos para desenvolver essa inteligência doméstica. 
O que dizem os pais: "Aos 9 anos, Sophia participa de tudo em casa, pois tenho marido e três filhos, e a faxineira vem apenas uma vez por semana. Todos colaboram", explica a fotógrafa Zaida Siqueira, de São Paulo, mãe também de Matteo, 17, e Giulia, 18. A caçula, além de cumprir tarefas básicas - como colocar a louça que usa na máquina de lavar, arrumar sua cama e seus pertences -, sabe recolher roupa do varal e promete na cozinha. Prepara chá, ovos mexidos, panquecas de aveia e até arroz integral. ''Aprendeu comigo, e agora já deixo ligar o forno para fazer torradas e bolo. Meus filhos maiores também cozinham. Gosto bastante de gastronomia. Nas férias, costumo oferecer oficinas de massas em casa." 

:4- ESTIMULE  A CULTURA 
O que dizem os especialistas: Mais do que simples entretenimento, as viagens e os passeios ao cinema ou ao museu ampliam o relacionamento com pessoas diferentes e o hábito da reflexão. "O contato com outras culturas oferece novos modos de ler o mundo", diz a educadora Silvia Viegas. Cada família pode adaptar a vida cultural ao seu orçamento. Ouvir música e ver um bom vídeo em família são também bons programas. 
O que dizem os pais: "Costumamos ouvir música e ver muitas exposições. Meus três filhos sempre tiveram intenso contato com a cultura popular", afirma a fotógrafa Zaida. Pesquisadora cultural, ela já clicou muitas festas e ritos nacionais, e, desde que os maiores tinham 8 anos, acompanham a mãe em suas viagens. "Sempre ficaram fascinados com as festas do Divino, de São Jorge, com as cavalgadas gaúchas." Dois momentos marcantes: Matteo conhecendo um rito de passagem de meninos indígenas e Giulia, ainda pequena, ajudando a decorar com flores uma rua em Ouro Preto (MG). A caçula já segue a mesma trilha. Na opinião de Zaida, o contato com a diversidade cultural é libertador. "Ficamos livres da falsa ideia de que só existe um jeito certo de viver e nos abrimos para o novo." 

5-DÊ MESADA A PARTIR DOS 7 
O que dizem os especialistas: É importante que a criança já conheça as notas e moedas e saiba fazer contas simples. Na faixa de 6 a 7 anos, ela já tem essas noções e, com acompanhamento de adultos, será capaz de desenvolver a capacidade de controlar a mesada. "O grande benefício - e também o maior desafio - é fazer escolhas com uma quantia limitada de dinheiro", acredita a consultora financeira Elaine Toledo, autora de "Saiba Mais para Gastar Menos" (Alaúde). Para ela, educação financeira nada mais é do que ensinar a pensar, com foco na economia. A mesada pode ajudar a criança a conter impulsos e assimilar o que significa adiar uma compra, poupar, avaliar o custo de um objeto de desejo e os benefícios (e prejuízos) das opções que faz. O valor, porém, é relativo e deve acompanhar os hábitos e os acordos de cada família. "Se é para a criança comprar lanche na escola ou para um sorvete nos fins de semana, a quantia, claro, vai depender dos lugares que ela frequenta." No cálculo, considere que a mesada só será educativa se exigir administração e reflexão sobre os gastos - se for alta demais, perde a função pedagógica. 
O que dizem os pais: "Dou mesada para o Gabriel desde que ele fez 9 anos", conta a dentista Márcia. O objetivo é que ele aprenda a lidar com o dinheiro e economize para conseguir o que deseja. "Mas ele ainda é um pouco imaturo e de vez em quando torra tudo. Certa vez, recusei um brinquedo. Ele foi juntando, conseguiu comprá-Io e ficou feliz. Foi uma conquista muito importante para meu filho. Em outro momento, poupou, pediu ajuda extra da irmã e me deu um presente. Recentemente, jogou futebol em casa e acabou quebrando um lustre. Suspendi o benefício, mas vou retomar. Como tenho uma filha mais velha, sei que esse é um recurso que funciona para a criança ter noção do custo das coisas e da necessidade de poupar." 

6-MENOS PAPO, MAIS EXEMPLO 
O que dizem os especialistas: O exemplo sempre foi a base da educação, mas, em tempos de politicamente correto, com tantos discursos vazios, tornou-se ainda mais valioso. "Não adianta a mãe dizer que é importante respeitar as pessoas se a criança a vê destratando funcionários", explica Silvia Viegas. Adolescentes estão muito atentos a isso e se ressentem da incoerência dos adultos que falam uma coisa e fazem outra. Esse item do pacote pedagógico obriga os pais a questionar seus valores. De que vale enaltecer a verdade e depois pedir à criança para dizer ao telefone que você não está em casa? Só o adulto que souber honrar a palavra terá como ensinar isso aos seus filhos. 
O que dizem os pais: Habituada a lavar a louça nos almoços de domingo na casa dos avós de seu filho, a dentista Márcia decidiu certa vez descansar antes da tarefa. Ao chegar à cozinha, encontrou tudo pronto. O autor da façanha era Gabriel, 10. "Ninguém pediu a ele. Gabriel agiu assim porque me vê fazer isso sempre. É a força do exemplo." 

sábado, 17 de novembro de 2012



SINCERIDADE  É  DOENÇA?  (Walcyr Carrasco)

    Sofro de uma inconveniente compulsão para dizer a verdade.    
    Seria uma qualidade, se não provocasse situações
constrangedoras. Como na ocasião em que fui apresentado ao elenco de uma montagem sobre a vinda da família real ao Brasil, na Casa Julieta de Serpa, no Rio de Janeiro. Diante da intérprete de Carlota Joaquina, disse:
   - Você é perfeita para o papel!
   Ela sorriu, feliz. Tragicamente, continuei:
   - Carlota Joaquina era muito feia!
   Foi um horror. O pior, nessas situações, é tentar remendar.
   Uivei:
   - Não que você seja feia, assim... feia. Seu nariz é que é... quero dizer, reto. É, reto, e isso dá um charme especial porque seu quelXo...
   O clima piorou. O maquiador, velho amigo meu, avisou:
   - É melhor ficar quieto.
   Silenciei.
   Saias justas como essa são frequentes na minha vida. Recentemente encontrei com minha prima Damaris, 64 anos, numa reunião de parentes. Lá pelas tantas, o assunto girou em torno de aparência, rugas, cremes, cirurgias. Damaris perguntou:
   - Acha que preciso de plástica?
   - Precisa sim, respondi, impávido.
   Ela fechou a cara, bravíssima. Ninguém espera sinceridade quando pergunta algo assim. Quer elogio. Tenho terror a comparecer a estreias de teatro. Conheço muitos atores e, depois da peça, é praxe esperar o elenco para cumprimentar. Adquiri muitos inimigos sendo sincero nessas ocasiões. Depois de cativar patrocinadores, ensaiar meses e até botar a própria grana no projeto, alguém quer franqueza? Principalmente na noite da estreia, em que só se espera glória?
   Senti isso na própria pele. Já sofri o horror da sinceridade na estreia da minha peça Batom, com Fulvio Stefanini e Luiz Gustavo. Meu irmão Ney aproximou-se, com um sorriso atarraxado no rosto.
   - Quase morri de rir.
   Inflei de orgulho. Ele concluiu:
   - Também, com esses dois, até a lista telefônica fica engraçada.
   Despenquei. Dá para ser pior do que escrever uma peça tão divertida quanto a lista telefônica? Mesmo sabendo quanto dói uma verdade, tenho dificuldade em mentir. Uso uma fórmula para teatro, shows ou qualquer situação em que tenha de cumprimentar o responsável por algo pavoroso. Dou um abraço bem forte e murmuro com voz de mel:
   - Estou tão feliz por você!
   Não quer dizer rigorosamente nada. A pessoa interpreta como elogio. E não minto, o que me daria uma sensação desagradável.
   Soube que, nos Estados Unidos, há um debate em torno do manual de diagnósticos e estatísticas da Associação Americana de Psiquiatria, referência internacional para tratamento de doenças mentais. Querem reformulá-lo estabelecendo novos transtornos mentais, como a compulsão alimentar.
    Uma corrente de psicólogos e psiquiatras é contra. Penso que a sinceridade compulsiva deveria ser incluída como nova e recém-diagnosticada enfermidade. O sincericídio. Minha amiga Verônica, produtora da Globo, garante sofrer desse mal:
   - Queria não dizer a verdade, mas de repente sai! E me quebro toda.
   Verônica pensa em tatuar "cale-se"nos pulsos.
   - Assim aprendo a olhar para os pulsos e fechar a boca antes de ser franca demais com alguém!
   Antigamente, os reis matavam os mensageiros que traziam más notícias - como uma batalha perdida. As pessoas se enfurecem com a verdade. Ninguém quer franqueza, mas elogio. Se uma mulher pergunta se está gorda, quer ouvir que emagreceu. Se uma dama aparece vestida como um espantalho numa festa, pretende que comentem sua elegância. Na cozinha, no teatro, na matemática, no meio acadêmico ou no publicitário, todos sonham com louvores. Há exceções. A atriz Irene Ravache, antes de montar um espetáculo, promove uma leitura do texto em seu apartamento, em São Paulo. Convida amigos e profissionais. "Hoje é a noite da franqueza rude", diz.
   Todos são convidados a dizer exatamente o que acham após a leitura da peça. Autor, diretor, produtor, atriz, todos ouvem.
   E partem para afinar o espetáculo. Irene é uma raridade. São poucos os capazes de ouvir uma crítica com elegância.
   Já perdi muito amigo por excesso de franqueza. Sincericidas sofrem demais, pois amar e dizer a verdade nem sempre dá certo. Chefes costumam ser raivosamente sensíveis à sinceridade absoluta. Na infância, nossas mães nos ensinaram que era lindo dizer a verdade.   
Foi, digamos, um erro de formação.
   Enquanto não surge uma terapia para a franqueza compulsiva, melhor manter a boca fechada. E evitar o suicídio social, amoroso e até na empresa. .
   Quem quer franqueza?
   A sinceridade compulsiva deveria ser uma enfermidade mental - o sincericídio

Walcyr Carrasco é jornalista. autor de livros, peças teatrais e novelas de televisão.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

FORA DA ÁREA


   Você fica sem chão quando esquece o celular, quando não há sinal, quando a maldita bateria acaba?? Checa mensagens e acha que o aparelho tocou o tempo inteiro?
   Pode ser nomofobia, o medo patológico de ficar sem conexão - e uma doença que cresce tão rapidamente quanto a telefonia móvel no mundo.
Por Cristina Nabuco

    Em um mundo com 7 bilhões de habitantes, já existem 6,39 bilhões de liinhas de telefonia móvel. O celular chegou até onde nem sequer tem água potável. Só no Brasil, há mais aparelhos habilitados do que habitantes.
  "Símbolo de status, inclusão social e autonomia, o celular atende à exigência de estar disponível o tempo todo - e derruba as fronteiras entre trabalho e vida pessoal", explica a antropóloga Sandra Rúbia Silvia, professora da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, que investiga o impacto dessa tecnologia nas relações sociais. "A rotina acaba sendo cadenciada por esse aparelho e há grandes chances de ultrapassar o limite de uso que seria razoável", alerta o psicólogo Cristiano Nabuco, coordenador do Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso do Instituto de Psiquiatria da USP. Na velha e boa linguagem analógica, todos esses dados e evidências querem dizer o seguinte: com tantos aparelhos à disposição. aumenta a probabilidade de que eles virem unla espécie de extensão do corpo. Portanto, aparece a probabilidade de que os usuários fiquem conectados demais, dependentes demais, doidões demais - até os limites do vício.
    É a nomofobia. O termo vem de um trocadilho criado pela imprensa inglesa: no-mobile ou apenas no-mo. Trata-se do medo de ficar sem conexão via celular, smartphone & que tais. E é um distúrbio bem democrático em sua incidência. Na Grã-Bretanha, por exemplo, subiu de 53% em 2008 para espantosos 66% dos usuários, conforme estudo divulgado neste ano pela SecurEnvoy, empresa especializada em senhas para telefonia móvel. No Brasil, pesquisa da Ipsos feita com mil moradores de 70 cidades, de ambos os sexos, mostrou: 18% admitiram ter dependência de seus aparelhinhos. O número, claro. pode ser bem maior. "Nem sempre existe a noção da dependência. É comum as pessoas alegarem que vivem conectadas por causa do trabalho ou da família", diz a psicóloga Iracema Teixeira, professora de Pós-Graduação da Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro.

Usuário ou dependente?
     A designer de joias carioca Karina Gandelman, de 29 anos, passa o dia pendurada no celular. "Uma vez esqueci o carregador. Desesperada, fui de andar em andar procurando um igual. Não achei. Fiquei dez horas no escritório off-line, uma tortura!" Ela usa o telefone nas horas vagas. "Se gosto de algo, fotografo e posto. É quase um Big Brother." Não desliga de madrugada. "Falo ou troco mensagens com uma amiga de Los Angeles às 2 da madrugada." O cabeleireiro Ricardo Lemes, de 33 anos, de São José do Rio Preto, interior paulista, também integra o rol dos hiperconectados. "Nunca esqueço o celular. Já faz parte de mim. Uso para marcar horário para clientes, encontrar endereços. buscar informações sobre cabelos e meus cantores favoritos e interagir com amigos." O máxiimo que consegue ficar desconectado é por algumas horas. Mais do que isso, fica irritado. "É bom ir para o meio do mato, mas com sinal de celular!", diz.
      E aí: Karina e Ricardo seriam usuários habiituais ou doentes? "Depende de quanto a tecnologia interfere na produtividade e nas interações sociais de cada um", esclarece Iracema Teixeira. A nomofobia é um transtorno do controle dos impulsos, assim como a dependência de sexo ou de compras. "Nesses casos, há um impulso incontrolável de executar um ato que pode ser prejudicial para a pessoa ou para os outros, depois uma sensação de alívio, às vezes seguida de culpa", informa Cristiano Nabuco.
     Pistas de que você e seu celular podem estar com uma relação meio neurótica:
• Ele fica ligado por 24 horas, mesmo quando você está dormindo - ele é o despertador!
• Carregá-lo sempre à mão, para atender mais rápido.
• Ver mensagens, tuitar ou atender chamadas em reuniões de trabalho, dentro do cinema, em compromissos familiares e até jantares a dois.
• Interromper o banho, o sono da madrugada - ou até a relação sexual! - por causa dele.
• Não se desconectar nem mesmo no fim de semana para se dedicar a outras atividades.
• Andar com o carregador na bolsa para não correr o risco de ficar sem bateria.
• Entrar em estado de profunda ansiedade ao esquecer o telefone.
• Ouvir amigos e familiares reclamando que você não desgruda do aparelho.
    Um nomofóbico clássico tem dificuldade de conter os arroubos de fazer uma ligação, mandar um torpedo, navegar na rede. Fica abrindo e fechando o aparelho o tempo todo. Pode jurar que ele estava tocando ou vibrando, aí corre para atender e percebe que foi imaginação. É uma movimentação contínua, que alivia a ansiedade, dá prazer e tende a ocupar cada vez mais o seu tempo. "É quando ocorre o desequilíbrio entre a necessidade de uso e o anseio de estar conectado", explica Iracema Teixeira. Obsessivo, o dependente interrompe banho, sono, jantar em família e encontro romântico por causa do celular. Se tivessem de escolher entre sexo e o telefone móvel, três em cada dez mulheres abririam mão da vida íntima, revelou uma pesquisa global da Ipsos com 19 271 adultos de 25 países.
    Longe do aparelho. o dependente entra em estado de angústia e em crise de abstinência, com seus conhecidos sintomas: irritabilidade, agitação, suor frio, taquicardia e dores de cabeça. Ainda que não chegue ao estágio de dependência, o uso compulsivo leva ao estresse e atrapalha a concentração. As demandas constantes de ligações e mensagens mantêm a atenção do usuário sempre meio flutuante: "No jantar, você não se concentra na família e nas crianças. Quando vai ao cinema, não presta atenção no filme, porque está sempre preocupado", exemplifica o psicólogo americano Larry Rosen, no recém-lançado iDisorder (sem tradução em português), que aborda os transtornos causados e potencializados pelo uso excessivo de iPhones e afins.
     O corpo também pena. Duas novas doenças já foram tipificadas e associadas ao uso intensivo desses gadgets. A textingtendinitis é uma lesão por esforço repetitivo que produz inflamação e dor na base do polegar por sobrecarga da articulação - e prejudica movimentos cotidianos, como escrever, apanhar objetos e dirigir. E a textneck aparece por causa da má postura que se adota para olhar celulares e tablets: aquele estranho arco em que a cabeça tende para a frente e o pescoço fica estendido. Tensionados, o pescoço e as costas começam a doer. E há os possíveis - e sempre controversos - efeitos da radiação. Paira sobre o celular a suspeita de danos por aquecimento dos tecidos, como dores de cabeça, catarata, zumbido no ouvido e até câncer. Os estudos não são definitivos, mas, por via das dúvidas e como forma de estimular o uso com moderação, a Organização Mundial da Saúde o classificou como "potencialmente cancerígeno". Banir os celulares hoje, claro, soa tão maluco quanto imaginar que há pouquíssimos anos todo mundo vivia muito bem sem eles. Nos casos de vício bravo e diagnosticado, os especialistas indicam psicoterapia e medicação. Nos casos de suspeita do nomofobia, a regra é cristalina: o melhor é dar uma relaxada para se reconectar à vida real. Conversar com as pessoas, andar no parque, olhar as nuvens, praticar exercícios. E depois não correr para o celular para contar a alguém.

                       (Revista LOLA, outubro de 2012)

sexta-feira, 2 de novembro de 2012


AOS QUE PARTIRAM
  
        Nesse Dia de Finados quero lembrar de todos os amados que já partiram.
     Meu amado pai, Francisco da Silveira Peixoto, com quem vivi apenas 10 anos. Minha amada mãe Izolete, meu esteio, meu exemplo, minha estrela. Minha amada tia, madrinha e segunda mãe Ernestina (Tita), também meu esteio, meu exemplo e minha estrela. Meu amado irmão, amigo, parceiro inesquecível Aimoré. Minhas tias maternas Diva, Hermínia (Mimosa), Francisca (Filhota) e tios Vicente (Santico) e Mortimer, o quais não cheguei a conhecer. Os tios paternos com quem convivi: Almerinda, Lucinda, Adil e Nilo.  As tias-primas Olinta e Amanda, os primos João Alberto, Rui, Vera, Cláudio. Minha meia-irmã Nair e seu filho Vitório, queridos que já se foram.
      O pai da minha filha, Ubiratan (Bira), e dos meus filhos José Carlos e Maíra, que não tiveram a chance de viverem. Os meus queridos sogros Belo (meu segundo pai) e Bela, os saudosos cunhada Nice e seu esposo Henrique, aos queridos tias Ana (Bonato), Noemi, Geni, Nadir, Flora, Chininha, Zeni, Mimosa, Dorica  e tios Geraldino, Neto, Nelson, Valter, Alfredo.
       Os queridos  alunos que já se foram, representados aqui pelo  Volmir  Colin, cujo filho Felipe é hoje grande amigo do meu neto Jean (eu considero meu neto adotivo) e o  Jean Papalia, ex-guitarrista da banda BJack e policial militar.  Sei que há outros, mas não lembro os nomes. Todavia rezo por eles sempre.
      As queridas e inesquecíveis colegas do Thomás Fortes que já foram descobrir os mistérios do além: Ione Braga, Elaine Athaides, Izolina Leite, Loremi Terra, Maria Sônia, Lourdinha, Heloísa Medeiros, Angélica Vielmo.
        Enfim, todos aqueles familiares, parentes, colegas, alunos, amigos que passaram pela minha vida. Que Deus os guarde junto dele, iluminados pela Sua luz e lhes dê o merecido descanso eterno.
          Um dia nos reencontraremos todos lá do outro lado.
                                                                                                        
                                           02 de novembro de 2012.