terça-feira, 11 de julho de 2017

SEM COMPLICAÇÕES

    
      Como era o truque do clipe? Ah, enganchar um clipe no puxador do zíper, amarrar uma linha, colocar o vestido, puxar a linha e daí o zíper subia. Com a linha fina não ia dar certo. Se puxar, ela arrebenta. E uma mais grossa não cabe no furo do clipe. E o vestido tinha que ser esse. Outra linha, média, que coubesse no furo do clipe e não ar- rebentasse, ela não tinha. E agora, com 1 ou 2 quilos a mais, o zíper ficava mesmo lá embaixo, não subia quase nada e não dava para puxar só um pouco, ao menos de modo que desse para puxar o resto com a mão. E o pior é que não havia ninguém para pedir ajuda. Droga. Ninguém para dar assistência. Não dava para chamar o zelador para isso. Definitivamente, não. Seria constrangedor, uma intimidade não aconselhável. Um vizinho? Não, não tinha criado amizade suficiente com nenhum deles a ponto de pedir um favor como esse. E depois, como? Ia tocar a campainha com um vestido semiaberto, os pneus saltando, ser alvo de comentários posteriores: "olha como ela engor- dou", "coitada, tão sozinha", "não tem quem ajude a fechar um zíper", "será que ela não se toca que esse vestido não serve mais?". Ela sabia que, uma vez fechado o zíper, a aparência final seria semelhante à de quando os pneus ainda não existiam ou, ao menos, não eram tão perceptíveis - não com aquele volume, de um jeito que dá para pegar com os dedos e puxar. Mas como fechar o zíper?
      Talvez com um garfo. Enfiar o dente do garfo no puxador do zíper, amarrar uma linha
no cabo do garfo e puxar. Não só a linha soltou do cabo do garfo como o dente deu uma arranhada nas costas. E o diabo do zíper nada de subir. Ligar para a mulher do zelador? Pedir um fio mais grosso emprestado? Colocar um casaco por cima? Trocar de vestido? Assumir- -se mais velha? Aceitar-se como se é, como dizem essas novas propagandas do sabonete, do sutiã, do carro, do cigarro, da lavadora? "Mas como é que eu sou? Eu quero usar esse vestido. Quero parecer mais jovem, mais magra. Mas por que se ele não cabe mais? Porque não colocar um mais largo, folgado? Afinal, é só para ir até a padaria? Quando ele cabia, eu não tinha perguntas, não precisava saber se eu era eu mesma nem me aceitar." Um parafuso comprido. Sim, tinha um desses na caixa de ferramentas. Ela se deitaria de bruços, engancharia o parafuso no puxador do zíper e amarraria com o fio mais grosso. Pneus achatados não emperram o zíper. Funcionou. Levantada, no espelho, viu-se sumarenta, uma mulher e seu vestido, sem necessidade de zelador nem vizinhos, propaganda de sabonete ou autoaceitação, mesmo com os pneus escapando, o colo espremido, a respiração difícil.
      - Seu Claudionor, veja dois bem torradinhos, por favor!
      - Pois não, dona Odete. Faz tempo que a senhora não aparece. Vai no capricho. Aliás, a senhora parece mais jovem, mais bonita, não sei. Foi alguma coisa que mudou, dona Odete?
     Comeu as casquinhas crocantes dos dois pãezinhos ali mesmo, na padaria. Rabo de
um olho no Claudionor e do outro no espelho: uma mulher de vestido.
     Na banca em frente, uma das propagandas de amor-próprio. Arrancou o miolo de
um dos pãezinhos e jogou, discreta, no rosto sorridente da mulher do cartaz, aquela que se
aceita sem complicações.


(NOEMI  JAFFE – escritora, professora e crítica literária – revista CLAUDIA, julho de 2017)

quarta-feira, 10 de maio de 2017

ADEUS, REDES SOCIAIS

Não deixe de ler este texto bem maluquinho!



Decidi que o Facebook é um atraso na minha vida, que o Instagram está me dando tendinite e que o WhatsApp oferece aos meus pais e amigos a sensação de que estou no cômodo ao lado totalmente desocupada. Tem gente. que grava áudio de meia hora apenas pra reclamar de constipação intestinal. Vocês estão perdendo o controle.

Então escrevi um longo texto de despedi- da, cheio daqueles clichês sobre aproveitar a luz da minha varanda ao cair da tarde, colher fruta do pé, caminhar descalça em um parque, sobre a importância de nos olharmos profunda e presencialmente nos olhos, sobre essa coisa toda chamada contato humano
Mentira, eu jamais escreveria essas chatices que emocionam a tia Cidinha. Eu apenas
disse que estava muito ocupada e que
, apesar de ser completamente viciada em saber o que todos vocês, sobretudo os menos interessantes, fazem da vidinha, daria um tempo das redes sociais e dos aplicativos de papo infinito. Seria muito difícil viver sem saber que sobremesa você fotografou, que vestido de renda branco você usou, que foto do seu filho numa poltroninha ao lado de um ursinho "seis meses, cinco dias e duas horas" você postou. Sim, mas eu sobreviveria. Até porque é preciso focar no trabalho pra sobreviver.
Acontece que, após publicar minha carta de desintegração, achei por bem acompanhar seus desdobramentos. Quem iria ao meu pseudovelório virtual? "Não, por favor, não faça isso, você alegra meu dia", imploraram alguns. "Já vai tarde, te acho uma sonsa", comemoraram outros(pra sempre me perguntarei por que pessoas que não gostam de mim me seguem, leem o que escrevo, e comentam diariamente nas minhas páginas). Achei educado responder aos queridos e necessário bloquear os indigestos.
Daí, achei educado responder à amorosa dos fofos e desbloquear os desgraçados (eles têm o direito de me odiar, ora essa!)Segui respondendo infinitamente para alguns e bloqueando e desbloqueando eternamente outros, e novamente. Então achei importante avisar que "assuntos de trabalho" seriam tratados por e-mail. Depois achei que meu e-mail pessoal não deveria estar assim tão exposto. E mandei mensagens privadas a todas as pessoas que poderiam tentar me procurar pra falar de trabalho. E os amigos que iriam me procurar para festas, jantares, saudades? :Mandei a eles também mensagens privadas com meu celular. Mas será que lembrei de todos? Criei então um grupo grande de conhecidos pra avisá-los de que eu não participaria mais de nenhum grande grupo de conhecidos.
Tenho um vício terrível chamado explicação. E porque os outros têm um vício terrível
chamado provocação, escrevi mais e mais cartas de despedida. Textos pra explicar que não era pra sempre. Textos pra explicar que não era nada pessoal. Textos pra explicar que ironia não é pra todos. Textos pra explicar por que eu estava me explicando. Textos dizendo que eu não devia nada a ninguém. Textos explicando por que, mesmo não devendo nada a ninguém, eu ainda devia essa e mais essa explicação.
E, ao fim de dez dias tentando escrever minhas últimas palavras nas redes sociais, achei
mais fácil desistir de desistir e postei uma foto do pôr do sol na minha varanda. Às 4 da ma-
nhã, acordei com uma angústia terrí
vel, só pacificada ao ver mais de 50 likes.  

(TATI  BERNARDI - escritora, redatora, roteirista de cinema e I televisão. Seu livro mais recente é “Depois a Louca Sou Eu” – revista CLAUDIA, abril 2017)

domingo, 30 de abril de 2017

O CADEADO DA PRAÇA

  Pus a mãos na tela para amparar minha perplexidade: alguém jogou uma bomba na praça da minha infância.
   
    Eu não sei o nome daquela praça que há em frente ao Hospital de Caridade, mas nós a chamávamos de pracinha do hospital. Tinha gangorra, escorregador, balanço, caixa de areia e roda giratória. Tudo bem simples, de madeira e ferro, mas pintado com cores pri-márias, dando ainda mais vida àquele lugar fervilhante de crianças de todas as idades. Eu brinquei muito ali com meu irmão. Minha irmã caçula, 12 anos mais moça do que eu, pas-sava as tardes brincando ali. Quando tive meus filhos, eu fiz questão de trazê-Los para conhecer o lugar que me remetia ao encantamento da infância. Meu irmão fez o mesmo, e os filhos de minha irmã também brincaram muito na pracinha do hospital.
    Na semana passada eu quis ir até lá com minha mãe para lembrarmos juntos o tempo que passamos fazendo castelos de areia com um baldinho de plástico azul e duas pazi-nhas amarelas. Foi na pracinha do hospital que eu e minha mãe lutamos de capa e espada contra vilões malvados, enfrentamos dragões e bruxas, decolamos em foguetes espaciais ou simplesmente sentamos num banco para descansar e sentir o afago de uma cidade que nos abraçava oferecendo o colo da convivência. Em vez disso tudo, encontramos um cadeado no portão.
   Pus as mãos na tela para amparar minha perplexidade: alguém jogou uma bomba na praça de minha infância. Em um terreno morbidamente vazio, há quatro ou cinco montes de entulho. Enxergo neles, a sepultura de cada brinquedo.
   Quem permitiu transformar a pracinha do hospital num cemitério de escorregadores e gangorras? Uma praça trancada a cadeado é um símbolo poderoso. A gestão pública está nos dizendo que a cidade não nos pertence. Ao negar-nos o espaço do convívio, A prefei-tura rouba das crianças a oportunidade da partilha, do aprendizado que o contato humano proporciona, do acontecer solidário que ocorre toda vez que famílias se encontram para brincar com seus filhos. Uma praça fechada é uma afronta à cidadania. Não há justificativa para isso. Não me venham falar em crise ou falta de dinheiro.
   Para um burocrata, pode até ser que uma praça fechada seja um item da planilha do corte de despesas. Mas, se eu fosse prefeito e me deparasse com um cadeado no portão, eu rasgaria a planilha, mandaria arrebentar a corrente e iria pessoalmente para o meio do terreno, empurrando um caminho de mão, para dar início à retirada do entulho e à ressur-reição dos balanços sepultados pela inépcia e pelo descaso. Não é a falta de dinheiro que decreta a falência de uma comunidade. Uma cidade que impede seus moradores de entrar numa praça é que é uma cidade falida. Espero, sinceramente, que o novo prefeito tenha peito de governar arrebentando cadeados.

(Marcelo  Canellas – Diário de Santa Maria, 25/09/2016)

quinta-feira, 13 de abril de 2017

PÁSCOA



Há  mais de dois mil anos atrás, um homem veio ao mundo 
disposto a ser o maior exemplo de amor e verdade que a 
humanidade conheceria.

Sua proposta de vida não foi entendida por muitos e, então, 
condenaram este homem e crucificaram-no, ignorando todos
 os seus propósitos de um mundo melhor.

Houve dor, angústia e escuridão.

Por três dias, o sol se recusou a brilhar, a lua se negou 
a iluminar a Terra, até que, no terceiro dia, algo aconteceu...

Houve a ressurreição!

A Páscoa existe para nos  lembrar deste  espetáculo 
inigualável chamado “ressurreição!”

                                                 Páscoa                                                             

                                   Ressurreição  do  sorriso...

                              Ressurreição  da alegria de viver...

                                                     (www.belasmensagens.com.br/mensagens-de-pascoa.php)


quinta-feira, 6 de abril de 2017

O PROPÓSITO DA VIDA

    Todos nós buscamos a tal da felicidade. Pessoas passam a vida inteira procurando es-se sentimento sem nunca conseguir vivê- lo plenamente. Uma pena, pois, segundo os sá-bios da Índia, ele está mais perto do que podemos imaginar: mora dentro da gente, em nossa verdadeira essência. Encontrá-lo exige bastante dedicação.
    Ensinam os mestres que cada um de nós tem um propósito especial na vida. Trata-se de um talento único que deve nortear todos os nossos pensamentos, palavras e ações. Um indivíduo só consegue encontrar a real felicidade, no sentido mais profundo da palavra, ao descobrir seu verdadeiro dom e viver em concordância com ele. Mais do que isso: nós, se-res humanos, só podemos experimentar o êxtase da vida, uma condição sublime e, infe-lizmente, vivida apenas por poucos hoje em dia, quando nos tornamos capazes de usar tal dom especial para promover o bem ao próximo. Esse é, na verdade, o maior objetivo da vi-da, a exaltação do espírito.
    Vivenciar esse propósito e cumprir sua missão é a única maneira de evoluirmos. O nas-cimento de um filho, portanto, é uma grande oportunidade para o crescimento. Ao mesmo tempo, trazer um ser humano à vida é uma enorme responsabilidade. Costumo dizer que a maior função dos pais é observar os filhos com cuidado e amor para ajudá-los a identificar e compreender seus dons. Cabe a eles ainda orientar os rebentos no cumprimento de seus desígnios para que vivam em paz e bem-estar. Dessa maneira, estão não só trabalhando pelo bem da própria família mas contribuindo para um mundo com mais alegria e justiça. 
    Agora  você  deve estar  se perguntando:  "Como é possível encontrar meu verdadeiro
dom?". Ou ainda: "Como faço para saber se estou agindo de acordo com meu talento?". Fazer essas perguntas é o primeiro passo dessa busca. Afinal, mostra que você tem interesse pelo auto conhecimento. Não importa sua idade, nunca é tarde para começar a procurar. Inicie prestando atenção em você. Parta para uma jornada espiritual em busca do
seu verdadeiro eu, da sua  verdadeira  natureza. Observe  e  analise  suas  características,
suas preferências, suas ações, o modo como se relaciona com as pessoas que ama, com seu trabalho. Para onde tais atitudes conduzem você?  Onde  e  como  se  sente mais feliz,
mais serena? E, por outro lado, onde estão os conflitos? De que forma acredita fazer a di-f-rença para a comunidade em que vive? Você encontra sentido em suas ações?
    Se sua busca for diária e persistente, não tenho dúvidas de que você identificará ações
e atitudes em que se destaca e que a deixam tão absorvida que mal é possível notar a passagem do tempo. Estamos no mundo para a jornada de autoconhecimento e, por meio
dele, de autodesenvolvimento. Esse deve ser nosso objetivo maior. Você terá certeza de que encontrou seu propósito quando a vida lhe parecer leve como uma pluma. Tédio, apatia ou cansaço não farão parte da sua realidade. Imagine como seria o mundo se cada um vivesse em sintonia com sua essência e ainda a estivesse usando para o bem do próximo.
    Nossos corações são moradas habitadas por deuses à espera de uma chance para ser libertos. Não perca essa oportunidade.

(MARCIA  DE  LUCA – revista CLAUDIA, março de 2017)