domingo, 11 de dezembro de 2011

OS SEGREDOS DE CHANEL

          Não há quem não saiba quem foi Chanel .Ela se tornou um ícone, um mito. Suas criações, como o vestido pretinho básico, seus “tailleurs”, suas pérolas, suas bolsas, seus perfumes ainda povoam os sonhos de consumo das mulheres, por mais que a moda sofra mudanças. Chanel é um clássico e os clássicos são para sempre.
       Os mitos constituem uma fonte de assunto. Principalmente nos tempos de hoje, em que se tornou moda desconstruir os mitos. Coco Chanel também não escapou a esse destino. Muitos livros foram escritos e vários filmes foram feitos sobre o mito Chanel. Mas agora surgiram novas obras, que mostram um ângulo diferente da Chanel que todos conheciam: uma Chanel que suspeitavam, mas sem muita certeza, uma mulher com muitos amores (rápidos, espalhafatosos, bissexuais), o uso de drogas.
       Um desses livros é Coco Chanel: An Intimate Life, da americana Lisa Chaney, que mostra uma mulher  dada a amores proibidos com homens e mulheres, o vício no uso do opiáceo Sedol, que se autoaplicava todas as noites. Mas o livro mais chocante é Dormindo com o Inimigo – a Guerra Secreta de Coco Chanel, do também americano Hal Vaughan. Ele aborda uma Chanel que, durante a Segunda Guerra, foi amante de um belo oficial alemão, o barão Hans Günther von Dincklage, o que a levou a ser recrutada pela Abwehr, o serviço de informações do Estado Maior alemão, tornando-se a agente F-7124, que usava o nome-código de um de seus outros amantes, o duque de Westminster.
       Chanel foi uma boa agente,  fez vários trabalhos importantes para a espionagem alemã, e se aproveitou disso para tomar o controle do perfume Chanel nº 5, que era na época propriedade de dois judeus, seus antigos patrocinadores, os irmãos Wertheimer, que haviam fugido para os Estados Unidos.  Ela não teve nenhum escrúpulo, pois sempre fora antissemita, tolerava apenas os judeus ricos.
      Estas revelações surpreendem a princípio, mas, pensando melhor, vê-se que têm uma base real, pois como poderia Chanel ter continuado a morar no luxuoso Hotel Ritz, mesmo depois que os alemães o requisitaram para moradia do seu Estado Maior, após terem invadido Paris?
         É claro que estas coisas só poderiam surgir agora, depois de tanto tempo, já que Chanel foi cuidadosa ao deixar vazar somente os seus aspectos que interessavam. Deixava ver apenas a mulher serena, impoluta, a grande senhora, orgulhosa. Mostrava-se independente, ostentava sua liberdade, sua revolta, não ocultava seus amores, declarava-se livre de preconceitos, tinha atitudes provocadoras.. Em outras palavras, divulgava suas audácias chiques, mas cobria com um véu o que poderia ser duvidoso em seus amores ou atitudes.
      Em resumo, Chanel mentia, trapaceava, era hipócrita. Ela se inventava. Era seu próprio romance. Isto teve origem na necessidade que tinha de esconder sua origem humilde, sofrida. Depois de famosa, falava de um pai aventureiro que fora para a América e fizera fortuna por lá, e de duas tias ricas que a ampararam. Nada disso era verdade.  Sua infância foi um romance de Charles Dickens, cheio de abandono, grosseria, brutalidade, humilhações.
      Chanel nasceu em 1883, num vilarejo da época da Idade Média. Seu pai era um camelô que trabalhava de feira em feira e que desapareceu quando a mulher, uma costureira em domicílio, morreu. Ela e suas duas irmãs menores foram parar em um orfanato numa abadia cirsterciense, num fim de mundo. Lá viveu por 6 anos, até completar 18 anos, quando foi mandada  para um lugar onde aprenderia o ofício de costureira, para fazer os vestidos das grandes  damas. Mas Chanel não fora feita para tal vida e tratou de conseguir um contrato num musical. Passou a cantar todas as noites para os soldados do 10º Regimento de Caçadores a Cavalo. Um das suas cançonetas, “Quem viu Coco no Trocadero”, levou os militares apaixonados pela bela  senhorita a apelidarem-na de Coco. E, é claro, com eles Chanel aprendeu também os truques do amor e do sexo.
       Eis aí a fonte das mentiras: dessa infância esfarrapada, ela extraiu seu talento, sua dureza, sua revolta, sua frieza, sua avidez pelo sucesso. Mas, por vergonha, escondeu os anos terríveis e fabricou outra história para si. Todavia, as influências do ambiente onde fora criada refletiram-se nas suas criações: o “logo" da Chanel  (dois C entrelaçados) veio dos vitrais da abadia onde viveu; os vestidos simples, sem enfeites, refletem a nudez das paredes do convento e a própria roupa das religiosas que lá viviam: retas, sem marcar formas, a preferência por cores suaves e neutras.
  Sua convivência íntima com os militares, na juventude, levaram-na a interessar-se, provavelmente, pelos arrogantes e soberbos oficiais alemães, que despertaram sua paixão pelos uniformes, a qual se refletiu também nas suas criações: bonés copiados dos marinheiros, o uso de malhas, pelicas, casacos de couro. Fez um verdadeiro desvio do masculino para reinventar o feminino.  Na época da guerra, em vez de fechar seu ateliê, Chanel levou-o para outra cidade, Deauville, e depois Biarritz. Com a escassez de tecidos, pelo confisco, comprou estoques do jérsei destinado às roupas íntimas dos soldados e com ele fez roupas para a as mulheres. Um sucesso.
      Em 1944, correu perigo, quando, aos 60 anos, após a libertação de Paris e expulsão dos alemães, foi interrogada pela Resistência francesa sobre suas relações com os alemães, especialmente o barão  von Dincklage. Mas foi salva pela intervenção de Winston Churchill, que gostava muito dela e interveio em seu favor. Assim, viu-se livre e pôde ir morar na Suíça, onde ficou por 10 anos.
     Em 1954, retornou, reabriu sua“maison”, instalou-se no Ritz e reatou sua amizade com os irmãos Wertheimer, seus antigos patrocinadores. A princípio, suas criações não foram bem recebidas, dizem que por influência d o ciumento Christian Dior. Mas, algum tempo depois, inventou um ‘tailleur” de  tweed, cujo casaco de quatro bolsos era decorado com botões-joias e completado por uma blusa  do mesmo tecido de seda do forro do casaco.  Sucesso total.
    Já bastante idosa, atormentada, era tratada por todos como um ídolo, mas conservava-se distante, seca, exigente, de péssimo humor. E continuou assim até o final.
    Chanel foi a elegância do mundo. De 1913, quando seus primeiros vestidos foram lançados, até sua morte, aos 88 anos, em 1971, ela reinou absoluta. E ainda hoje continua escolhendo nossas roupas e nossos perfumes, visitando os sonhos das mulheres que apreciam a moda.





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