sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

“É BESTEIRA FICAR TENTANDO SER FELIZ.” (Contardo Calligaris)

           Aos 62 anos, Calligaris tem uma biografia que renderia um filme. Fugiu de casa, na Itália, aos 15 anos, para viver uma paixão em Londres. Viajou pela França, Suíça, Estados Unidos. Cursou Ciências Políticas, trabalhou como fotógrafo, estudou Letras e Filosofia. Precisando tratar de uma gastrite, decidiu fazer psicanálise e apaixonou-se elo assunto e foi para Paris, onde se especializou nessa ciência. Em 1985 veio para o Brasil fazer uma conferência e por aqui ficou.
            Além do trabalho como psicanalista, é colunista da “Folha de São Paulo”, publicou alguns livros, entre eles “O Conto do Amor” (2008), cuja continuação, “A Versão dos Fatos”, é esperada para este ano de 2011.
          Em uma entrevista à LOLA, em seu consultório em São Paulo, declarou que a ideia de felicidade total virou um produto de mercado. E que viver a complexidade de emoções e sentimentos é que faz a riqueza da experiência humana.   Eis algumas de suas colocações sobre o assunto:
Relacionamentos: Existe uma idéia errada de medir se um relacionamento deu certo pela sua duração. Um relacionamento dá certo pela sua qualidade, não importa o tempo que dure.
Busca da felicidade: Isto se tornou um produto de mercado. Serve apenas para ajudar a vender uma série de coisas que prometem nos fazer felizes.Eu não quero ser feliz porque preso a experiência na sua variedade e intensidade.Quero viver a complexidade de emoções e sentimentos que faz a riqueza da experiência
humana. Quero viver com alegria, inclusive as dores que a vida me apresentar. É doloroso, mas é crucial e comum a todos.
Sucesso: Se você deseja muito uma coisa, vai ter certa dose de frustração, porque existem coisas que você deseja e não terá. Mas não quer dizer que se deva viver uma vida limitada e sonhar pequeno para evitar possíveis decepções. Parar de desejar não é uma boa tática. O nosso tempo de vida é relativamente curto e o que faz a vida valer a ena é a diversidade de coisas vistas, conhecidas e tentadas.
Idealização:É impossível viver sem idealizar. Quem não tem esta capacidade é um sério candidato a uma depressão séria. Só não se pode idealizar demais para não sair da realidade.
A aprovação dos outros: A sociedade urbana e moderna é um mundo no qual somos quem somos graças ao olhar dos outros, de como nos veem, de como nos apreciam ou não.
Carência afetiva:É um sinal dos tempos. Não tentamos compensar a carência afetiva saindo com um monte de gente, mas saímos com um monte de gente para preservar a carência afetiva.As pessoas não se prendem a um único relacionamento para se manterem disponíveis para os que possam surgir.
Hipervalorização do sexo:É uma hipervalorização discursiva, não corresponde a um real desejo sexual, é mais uma atuação desse desejo. Minha impressão é que a média das pessoas tem pouco prazer sexual, uma vida sexual muito reduzida. A maioria dos casais transa pouco e porcamente, frquentemente por dever.
Liberdade: A liberdade é um fardo. Implica um alto nível de responsabilidade nas escolas que fazemos e gera uma série de incertezas sobre o que realmente desejamos. Não existe desejo que não implique perdas. É muito mais fácil ser um objeto nas mãos dos outros, pois idealizamos isso como sendo nosso conforto quando éramos crianças e vivíamos cercados de pessoas que nos diziam o que pensar e fazer. Por isso, os adultos têm um certa nostalgia da dependência.
A obsessão pela magreza: O higienismo se tornou, a partir do século XIX, uma das maneiras de controlar a nossa vida. É ele que diz o que devemos comer e fazer para ter uma vida saudável. É claro que trouxe coisas importantes, como o fato de termos começado a nos lavar. Mas trouxe uma ideologia pesadíssima. A magreza veio com isso e também a sensação de que o gordo é anti-higienista, inimigo das práticas que levam à saúde do corpo. Mas é importante considerar que nada disso tem a ver com a dinâmica da sedução, t5em a ver com uma dinâmica narcisista. Quem vai para a academia, malha para se mostrar para as pessoas do mesmo sexo. É o prazer de ser invejado.
Velhice: Envelhecer é se aproximar da morte e a morte não é legal.Todos sabemos que vamos morrer, mas sabemos mais isso aos 70 do que aos 25.Quando tinha 20 anos, alguém de 60 anos me parecia muito velho. É engraçado como essa percepção mudou ao longo dos anos. Hoje francamente não vejo diferença entre o que era minha vida aos 30 e o que é agora. Passei por algumas doenças, mas estou longe de sentir o peso do envelhecimento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário