terça-feira, 4 de setembro de 2012

A RAIVA QUE CONSTRÓI


     "Por raiva e ódio, as pessoas seguem em frente só para dar um bom troco"

   Quando alguém nos magoa e nos faz sofrer, o que acontece? Ou se fica magoada e se sofre, o que em grande parte das vezes termina em depressão, ou se fica com muita raiva. Mas a raiva - foi o que nos ensinaram - é um sentimento feio, baixo, que pessoas superiores não devem ter. Vamos discordar: uma boa raiva pode ser saudável e faz muito bem à pele, ao coração e à alma. Além de que, em certas horas, ninguém está  fazendo a menor questão de ser superior.  
     Conseguir ter raiva e passar recibo do que está sentindo é excelente para a saúde física e mental; a depressão leva a gente para a cama, tira a vontade  de tudo e conduz à inércia. Já a raiva leva a gente a fazer coisas, mesmo que sejam coisas erradas. Na depressão, você não se levanta nem para ir ao cabeleireiro; já na hora da raiva, você pinta o cabelo de vermelho e, ainda que fique péssimo, é bem mais  bacana que ficar prostrada olhando para o teto. Exemplos são sempre ótimos: se uma mulher é abandonada por um homem. entre o desespero e o ódio, o que é melhor? O ódio, claro.
      Por raiva e ódio, as pessoas seguem em frente só para dar um bom troco e mostrar que não é qualquer coisa - como um mal de amor - que as derruba. Quem foi o sábio que disse que viver bem é a vingança mais eficiente?
       A primeira providência de uma mulher com raiva é pensar: "Como é que vou me vingar?" Para começar, mostrando que não está sofrendo. Para isso,  é preciso estar na sua melhor forma, razão mais do que suficiente para perder aqueles 3 quilinhos, comprar um vestido novo, voltar a usar salto alto. Parece bobagem? Pois não é. Dificilmente você vai ver uma mulher se equilibrando num salto oito com depressão. De salto, automaticamente se encolhe a barriga, se levanta o queixo e os ombros ficam na posição certa, desafiando o mundo. E não é perfeito estar assim, em vez de arrasada?
    Uma coisa leva a outra: por sentimentos nobres, como o amor-próprio, o orgulho e a vaidade - e a raiva - não se deixa a peteca cair em público, e com isso vem o hábito de não deixar a peteca cair nunca. Reflita: se você é normal, deve ter raiva de alguém. O que pode fazer para irritar esse alguém? Ficar linda, ter sucesso, ser vista sorrindo, vibrando - ser feliz, enfim. Digamos que você seja uma desenhista de moda e que esteja sem a menor inspiração para criar a próxima coleção. Faz o quê? Pense numa pessoa que você detesta - por justa causa, é claro - e imagine que glória realizar um trabalho que seja elogiado, que faça com que você se torne a melhor de todas. Só de fantasiar esse delicioso prazer, toda a criação vai fluir fácil, como nunca aconteceu - só de raiva.
     A cada vez que for ao jornaleiro da esquina, lembre que pode se encontrar com ele - aquele que fez você sofrer tanto. E ele vai ver como você está muito mais linda agora, sem ele; deve estar sendo bem tratada, vai cogitar. E pode ser o máximo encontrar na esquina outro alguém que a faça "feliz para sempre", pelo menos por uns tempos. Ou não?
      Por isso, querida, quando vier aquela raiva cega, aquela vontade de gritar, de xingar, de matar, transforme toda essa energia a seu favor. Assim como o amor constrói para a eternidade, a raiva pode construir a prazo bem mais curto - e de superior e inferior, afinal, todos nós temos um pouco. É uma delícia ter uma boa raiva; sobretudo, muito construtivo.

                 (Revista  LOLA,   setembro  de  2012.)

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